Um dia vou ter um blogue.
Uma dessas modernices, um blogue. Vou ter um, cheio de dia, cheio de vida. Vou contar todas as alegrias e tristezas, o cheiro do pão quente pela manhã, o telefonema que me irritou e que me deixou tão tenso que nem consegui comer a sopa que derramei sobre a roupa. Vou-me divertir à grande, aliviar a pressão dos dias que me ensombram. Vou colocar as fotos mais incríveis, com as festas mais vibrantes, vou fotografar os cães da rua e os pássaros nos beirais, ou as dicotomias que me apeteçam. Nunca mais hei-de passar indiferente, todos saberão onde estive e invejarão cada camisola que pus para lavar.
Vou cifrar todos os textos, para que os possa reivindicar sempre que mos roubem. O algoritmo complexo há-de prever que a combinação de certas sílabas se conjuguem numa frase que só eu conheça e possa apontar à prova; como viver sem propriedade privada?
E desengane-se quem pensar que um blogue vale por si. Não! É um pilar de apoio de uma vida, vazio se esta não tiver sentido, robusto se a vida for plena. Aliás, um blogue é como um filho, e há quem os troque, quem passe horas a escrever tonteiras e nem se recorde se beijou o filho ao chegar. Há quem durma com o blogue e esqueça o parceiro carente. Eles não esquecem, e hão-de amaldiçoar certo autor vezes sem conta até um dia.
E sempre se deixa um traço fugaz no mundo. Sim, porque afinal os filhos morrem, em incentivo da proliferação da espécie, talvez; preferencialmente depois dos pais, ainda assim... Como prolongar a nossa existência até que nada mais reste? Mais fácil de acarinhar, sem termos de lhe limpar o rabo, o ranho, nem dar dinheiro para que o gaste na primeira tolice mal parida que lhe passe pela testa, o blogue é tendencialmente eterno, quando nos vamos também ele fica; principalmente se não testarmos que o apaguem ou não deixarmos senha de acesso.
Nesse dia vou escrever com vontade. E será à séria, sem caixas de seguidores, sem comentários, sem contadores que me iludam. Que me interessa o que digam, quem diga, e quem cuspa? Em mim ninguém há-de! Vão lá comentar o demo que os pese... Será assim, sem chatice, ninguém me há-de deixar a pensar senão eu e o que eu queira.
E sonharei com encadernações bonitas para as minhas páginas... Para os meus meninos. E com vê-los somados em piras como que prontos para imolar, só por mim, que levarei a cabo o crematório para lançar segundas e terceiras edições que se lhes seguirão convulsas, e que só eu saberei ler. Mas serão meus, das minhas exclusivas tripas, sem mulher ou amante que inveje por ter de lhes chamar também seus.
Assim como este ou aquele, que conhecerão, de ler e chorar por mais ou menos, mas principalmente sem linhas de conveniência, nem ligações ou recomendações para algo nem alguém que se admire ou a quem se agradeça.
Deixar-me-ei de funambulismos, será tudo pela certa.
E será assim também, como hoje, cada momento como se fosse sempre o último.
© CybeRider - 2009
18 comentários:
um dia... um dia...
que esse dia nunca chegue, pois este blog ja é "especial" por si só :)
este blog nao precisa de imagens, pois pelas palavras conseguimos imaginar as suas paisagens, este blogs nao precisa de palavras bonitas, que agradem muitos, pois este blog tem as palavras necessarias para chamar a atençao dos textos bem escritos, este blog nao precisa de outras encadernaçoes, pois o simples dá outro destaque, este blog nao precisa de estar sem seguidores ou contador, pois é neles que mostra a quantidade de pessoas que gostam deste espaço, apesar de às vezes nao dizerem nada...
porque este blog está simplesmente fantastico assim, pois nao acrescentaria nem tirava uma unica palavra (a nao ser nos comentarios :P)dos textos que lemos...
porque um dia será um dia, e nesse dia logo se verá o que farás ou nao :)
beijinho Cybe
E mais nada!
E já agora também o podes fazer codificado só para convidados em que és o único a conhecer o santo e a senha. E então todos se roerão de inveja...
E porque não?!
Mas entretanto continua a escrever bem como sabes.
Um dia que ainda não será hoje, porque hoje ainda tens de te entreter com mais um comentário.
Até gostaria de ver as fotografias. Quem sabe não tens tanto jeito para elas como para as palavras?
Mas para já, deixa ficar assim porque nós gostamos. E provavelmente nem olharíamos para as fotografias, de tal maneira absortas pelas palavras.
Quanto aos blogues, há de mil e um feitios, com mil e uma razões. Poderá ser para alguns um substituto da vida real, que lhes acalma a solidão. Para outros, maneira de revelarem os seus gostos caros e exclusivos, para outros uma maneira de desabafar, quando não encontram outra, para outros, a maneira que encontram de se encontrarem a si próprios, quem sabe, para outros um divertimento, para outros uma forma de transmitirem ideias... Tantas, tantas razões.
Falas em pessoas que trocam os filhos pelos blogues ou pela net. Li há dias numa revista as respostas de algumas crianças à pergunta o que lhes desagradava na mãe/pai. Um miúdo de 8 anos respondeu que gostava muito da mãe, mas não gostava que ela passasse tanto tempo no facebook, ele tentava conversar com ela mas não conseguia. Triste, digo eu.
Até podes descrever até à exaustão o cheiro do pão quente pela manhã, mas não conseguirás saber como é, até o cheirares, não é?
Escrever à séria? Não precisas de esperar ou de o querer fazer um dia ;)
Beijinhos, Cybe
não é um elogio o que vou escrever. não gosto de elogios cheiram-me sempre a esturro ou a crava. e como hoje estou constipada, não cheiro nada e também já recebi portanto não ando à crava, não há elogio. há somente o que de repente eu pensei:
o tempo tem sido escasso (confesso que a pachorra também) mas a verdade é que sempre que poiso na blogosfera, uma das primeiras portas onde venho bater é esta. podia perguntar "porque será?" e só não pergunto porque sei a resposta. é-me oferecida de bandeja em cada texto que leio e podia designá-la de "muito bom" mas estaria a ser tremendamente injusta ao classificá-la assim.
um dia... já vi(!) creio que com muito menos do que ali descreves mas com muito do que ali não descreves e é exactamente por isso que gosto.
Mas prometes manter esta casa?
Não sei se serias tu, num blogue "à séria"!
Eu cá não preciso de termos de comparação, para gostar mais ou menos. Não é isso que procuro. Sei o que este significa para mim, e tu também sabes, que eu sei que tu sabes.
Não sou, mas se fosse professor, não deixaria de atribuir um "vinte", a um aluno que o merecesse. E se esse mesmo aluno, num outro periodo, merecesse apenas um "onze", seria essa a nota que lhe daria.
Tudo terá um valor exacto, numa exacta situação, na forma como a cabeça de cada um de nós avalia os factores, os condicionantes, enfim, todo o envolvente contextual. Considero apenas justo, que lho atribuamos.
Venha daí esse blogue, Cybe!
;)))
Abraço.
Cybe,
Não mintas! Mentir não é bonito!
Se é auto critica, só tens de te redimir e ir beijar compulsivamente o teu filho e a mãe dele...
Cá mais para o fim deixas-me tentado! Mas, conseguirás tu, um arrancamento de tal modo bem-sucedido, que essa invejável independência se traduza nas linhas de texto, sem que isso te doa profundamente e te mate?
Reflecte!
Diz-me sobre o quê escreverias, nessa avidez transversal?
Um abraço
Cy dessa, méne!
;)
Olá Soraia!
Agradeço-te o voto de confiança. Comentário bonito, o teu!
Sabes, às vezes sinto-me forçado a pensar que tenho um dever, e nunca me tinha passado isso pela cabeça quando iniciei este espaço. Depois vocês foram aparecendo por cá e/ou comecei a visitar-vos e estabeleceram-se laços que têm permanecido. A certo ponto deparo-me com receios que me ocorrem de não querer desapontar, magoar. Dei uma trégua de uns dias, para pensar noutras coisas e menos no que este espaço representa.
Li os comentários desta caixa várias vezes, e as palavras que me guardam fazem-me ter saudades vossas quando deixo de actualizar as coisas.
Mas sinto que se me faltar a vontade vos perco, e isso pode ser um problema, que não existiria se não houvesse interacção, como não existe em muitos espaços.
Habituei-me já a que fosse assim. Sinceramente custar-me-ia que fosse doutra maneira.
Beijinho Soraia
Olá Caçador,
É isso, não é? A porta fechada faz-nos ficar sempre curiosos sobre o que estará lá dentro. Quantas vezes a qualidade não importa desde que não nos marginalizem...
(Eu sabia que me estava ali a faltar qualquer coisa...)
Olá mfc!
Quem me dera que isso fosse assim tão fácil. Não é vontade que me falta! Talvez seja mesmo o saber...
Obrigado pela força!
Olá Nirvana!
Acredita, não ias gostar de ver as fotografias, pertenço aquela estirpe que nunca se adaptou à era digital. Ainda tenho uma SLR da Canon à antiga, guardadita e com a qual me dava gozo captar imagens. A digital, está ali só para me aborrecer, não faço nada de jeito com aquilo, só de pensar que tenho de passar tudo para o pc e retocar e cortar e sei lá... Ná...
Pois é, bates sempre na mouche... Aproveitei estes dias para pensar também na razão disto para mim, e não encontro uma resposta directa, nem fácil, sei que precisava deste tempo para outras coisas, e no entanto... Talvez seja uma forma de guardar pensamentos, afinal sou um mero colector de velharias, tenho uma gaveta cheia de cassetes e acabei com os aparelhos que davam para ouvi-las, por exemplo; tenho dezenas de disquetes de cartão (daquelas enormes, que talvez nem saibas o que é...) e não tenho leitor para elas... Porquê? Não sei... Mas gosto de as ter e de saber que estão ali, assim como estas coisas que vou para aqui deixando. Não sei se são úteis, ou se volto aos primeiros textos algum dia, mas vão ficando...
E um dia apetecia-me mesmo ficar agarrado ao pão quente (em vez de pensar nisto), mas perdia-lhe a memória, e depois? O que ficava? Assim sempre posso ler o que significava para mim.
Beijinhos, Nirvana
Olá Escarlate!
Obrigado por não me elogiares, fico sempre a pensar que é bajulação e fico logo desconfiado. :)
Os dias estão mais pequenos, e isso por si já é terrível, de repente é de noite e a noite tem de ser longa para dar para tudo e de facto não há pachorra. Que não há mesmo!
Eu tento, tento a sério, que seja principalmente com muito do que ali não descrevo e com muito pouco do que lá disse.
E gosto muito de te ver por cá!
Obrigado pelo empurrão!
Olá Gemini,
Esta casa é como um mau programa de televisão. Agradará a alguns e nunca terá audiência que a justifique. Só o sei pelo retorno que obtenho, pelo que me dizem, que -como tu advogas- é sempre bom ainda que se oponham ao que digo, e também pelos valores estatísticos. Tal como um mau programa nunca acabaria se não houvesse estatística que o repelisse, desde que mantivesse o interesse das pessoas que o criaram, também um mau blogue pode existir à revelia das opiniões, ou isolado no espaço virtual, valerá a pena? Não seria muito mais fácil esconder a cabeça na areia e retirar toda a estatística e possibilidade de obter opiniões? Penso que sim, desta forma existiria com a sinceridade de ser por meras razões pessoais do seu realizador, sem que importasse qualquer outro facto. E talvez um blogue seja destinado a ser isso mesmo, porque na realidade raros são os que passam duas centenas de seguidores, muito poucos chegam ao meio milhar de leituras por semana, este... Bem, "este" vocês sabem.
E eu também sei, que esta trégua que me parece já longa, não o é apenas para mim, é também para quem aqui vem deixar algo de si, enquanto não há actualizações há mais tempo para todos visitarem outros espaços, que acabarão por beneficiar com estas ausências, e com certeza com maior mérito.
Outro que houvesse seria assim, e palpita-me que teria muito mais razão de ser. :)
Abraço, Gemini
Olá Mário!
E se todos trocássemos este tempo por uma maior dedicação aos que amamos, ou na simples busca de quem se ame? Não seria uma senda mais frutífera? É autocrítica também, assumo. Mas não sei se a redenção sumária bastará. No romantismo este raciocínio bastaria para que me entregasse de vez ao silêncio das trevas, agora já não há essa dignidade, só por isso -mera questão de moda- por mais que reflicta terei de voltar ao padrão que assumi. Já não me posso permitir a prossecução de paixões egoístas, como referes, a dor seria lancinante, e eu não passo de um medricas.
Um abraço, Mário
Olá Shark!
E se tu o dizes, quem sou eu para questionar que ando para aqui há minutos, comparativamente à larga experiência que carregas?
Pois se é para ser assim, então que seja...
Obrigado por esta chave de ouro!
;)
um dia hei-te ter um blogue...também já tenho...(ehehee)
modernices?...talvez...
manter-nos atualizados?...talvez...
ir na onda?...talvez...
desabafar?...talvez...
(...)...talvez...
mas talvez o faça apenas porque me apetece...até me apetecer...até nos apetecer...até...até...
até lá...estamos cá!...
e vamos martelando...como podemos...como sabemos...
talvez!!!
Olá Hellag!
Obrigado pela visita!
Há muitas razões que nos podem levar a uma aventura, ou a oito!!! :)))
Agora vou precisar de tempo para fazer uma visita mais apurada.
Pelo que vi há ali muitos pontos de vista geniais!
Até logo, e por favor sinta-se em casa!
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